Udog Fanzine - Acidez & Mamas
A acidez.
Para nós, é ela quem dita tudo. O açúcar e os taninos? São secundários. Queremos que o vinho reflita fielmente a acidez das uvas no momento da colheita. Tudo o resto será consequência.
E quanto mais penso nisso, mais paralelismos encontro com… mamas.😳 Sim, isso mesmo. Mamas!
Ninguém duvida: as naturais são quase sempre as mais bonitas (que coisa tão feia de se afirmar 😨). Grandes, pequenas, arrebitadas ou discretas, o que interessa, no fundo, é o equilíbrio com o resto do corpo, certo? Pois com os ácidos é a mesma coisa. Em maior ou menor quantidade, mais málico ou mais tartárico, o importante é que tenha equilíbrio. Parafraseando Charles Metcalfe, “EQUILÍBRIO, é a única coisa que todos os bons vinhos do mundo têm em comum”.
Claro que, tal como nas mamas, às vezes ganha-se com um pequeno retoque, uma pequena correção para emendar algum desequilíbrio, natural ou decorrente de algum azar da vida. Já provaram um vinho sem acidez? Gostam daquele carácter massudo e pastoso? Não, certo? Pois então que se façam pequenas correções. Desde que melhorem o conjunto e preservem o equilíbrio, serão bem vindas.
E o que dizer dos implantes de peso? Querem-nas grandes, volumosas e voluptuosas? Pode funcionar. Em certos contextos até brilham. Mas… para sempre? Tenho as minhas dúvidas.
Um vinho muito corrigido, enquanto novo pode ser entusiasmante? Pode! Mas e quando o tempo, a gravidade e a aglomeração de telómeros começarem a moldar o corpo? Pele descaída, carnes moles e de repente, ali estão - as mamas - rijas e empinadas, com uma textura de "borracha seca" apontando para a frente como se a idade tivesse passado por todo o lado, menos por elas. (para mais, veja Seca Técnica)
Há gostos para tudo, e sou dos que acreditam que o prazer não deve ser condicionado pelos equilíbrios maioritários. Se gostam, bebam lá esses vinhos com 30 ou 40 anos, de acidez surpreendentemente viva (será mesmo assim tão surpreendente?), com aquele bouquet tétrico de flores secas e fruta do chão em avançado estado de maduração.
Por isso, da próxima vez que quiserem entender a acidez de um vinho… estudem sobre mamas. É muito mais divertido e, surpreendentemente, o resultado será quase o mesmo.
Bebam vinhos que vos deem prazer. De preferência os nossos.😆
Seca Técnica
No nosso projeto, apanhamos as uvas com base na acidez. Apanhamo-las quando atingem o valor que procuramos (não é bem exatamente “no valor que procuramos”, mas para explicar com mais detalhe já cobro avença 😆) e é muito comum que nesse ponto não tenham ainda atingido a maturação fisiológica… muito menos a fenólica.
O essencial é garantir que os aromas, ou pelo menos os precursores aromáticos, já lá estejam (nem sempre se mostram, podem estar ligados aos açúcares e ser libertados apenas durante a fermentação). O resto não nos interessa. Não vamos ter o máximo rendimento em mosto nem os taninos perfeitamente maduros. Teremos quase sempre vinhos pouco alcoólicos, pouca cor e corpos elegantes, mas longe do peso que tantos procuram.
Ou seja: se o objectivo for fazer vinhos densos, alcoólicos e com muita extracção, ao famoso “estilo Parker”, então sim, a nossa abordagem está completamente errada. Porque de facto, deixar as uvas na vinha mais tempo tem como vantagem uma maior concentração de açúcares, maior definição/intensidade aromática e os taninos mais polimerizados, tornando-se mais estáveis e agradáveis ao palato.
Pessoalmente não aprecio os vinhos feitos desta forma, ou melhor... são assim como os "momentos" nos menus dos restaurantes "fine dining". Fantásticos numa dose muito pequena porque têm tudo em "muito". São super concentrados, belíssimos para impressionar a boca num primeiro encontro, fantásticos para sobressair na cegueira dos concursos, mas incapazes de me dar prazer ou provocar o desejo de beber a garrafa até ao fim.
Mas, e é neste "mas" que tudo se joga, o preço a pagar é muitas vezes uma queda significativa da acidez. Quando isso acontece, é preciso corrigir. Nada contra. Cada um faz como entende ser o correto. O que raramente se esclarece é isto: são vinhos mais intensos e poderosos de início… mas tendem também a morrer mais cedo. É falso que o álcool e/ou a acidez, só por si, sejam indicadores de potencial de guarda. Como digo, muitas vezes é precisamente o contrário.
Lembram-se dos vinhos do Alentejo no início dos anos 2000? Ou da famosa colheita de 2011? A colheita do século? Têm bebido bons exemplares recentemente? Eu não!
O princípio, parece ser este: Apanhando as uvas mais tarde teremos a concentração e os ganhos de rendimento mencionados em cima. Os vinhos serão bebíveis mais cedo e há muitos enólogos que entendem conseguir resolver os excessos, adicionando água e ácido. Os "13%" passam a "12%" e as pastosas "5g" por litro passam a "6g" ou mesmo para umas "crispy" "7g". O pH descerá também e o conjunto passa a parecer uma Barbie, esculpida segundo os mais exigentes requisitos de beleza e desejo. Engana-se assim, com um pequeno passe de mágica, o maior e mais antigo inimigo das aldrabices. O tempo.
Quem quiser apanhar uvas com base na acidez, como nós fazemos, tem de estar preparado para esperar pelos aromas. Muitas vezes, no início, só se sentem as notas vegetais (oh Mendes… andas sempre a apanhar uvas verdes!). E esqueçam os tintos muito escuros e extraídos. Os taninos e as antocianinas (que dão a cor), são instáveis e acabam quase sempre no fundo da cuba. Mesmo que espetem as uvas no lagar ou carreguem nas “delestages”, aquilo nunca vai ser uma "bomba". Esqueçam!
Mas sabem qual é a parte mais gostosa de tudo isto? No fim do dia… sai tudo espantosamente equilibrado... e prazeroso. Nada temos contra (até apoiamos) quem procura fazer "o melhor e mais concentrado vinho do mundo". Nós só queremos dar prazer a quem nos bebe os vinhos. E se ajudarem a fazer de um momento banal algo melhor e memorável... é o céu.
Ah! Já me esquecia: esta é também uma das razões pelas quais o nosso curtimenta não é cor de laranja. Mas isso… explicarei outro dia... se me apetecer.
Disclaimer: Lendo este artigo, podem ter ficado com a impressão de que o contrário dos vinhos feitos ao estilo "Parker" serão os vinhos feitos ao estilo "Mendes". Isso será uma conclusão errada e muito longe da ideia que pretendi transmitir aqui. Nunca tomem nada (nem mesmo o que eu digo ou escrevo 😆) como absoluto. O número de variáveis na realização de um vinho é tão grande que todas as afirmações encontrarão negações ou excepções. Sobretudo porque as uvas e o vinho estão irremediavelmente dependentes das mãos que os criam. Quem vos disser o contrário mente.
Vocês não sei, mas em mim, é dos fatores que mais contribui para que seja loucamente apaixonado pelos "quês e porquês" desta fabulosa bebida.
Patrocínio: Este artigo só foi possível graças ao apoio do novo Pitau Branco 2024. Um vinho vibrante, fresco e descomplicado, feito para acompanhar conversas animadas e momentos despreocupados.
Bebendo, comentando, "gostando" e partilhando com os vossos contactos e amigos, estarão também a contribuir para o sucesso deste projecto, mantendo viva a nossa independência.
Para nós, é ela quem dita tudo. O açúcar e os taninos? São secundários. Queremos que o vinho reflita fielmente a acidez das uvas no momento da colheita. Tudo o resto será consequência.
E quanto mais penso nisso, mais paralelismos encontro com… mamas.😳 Sim, isso mesmo. Mamas!
Ninguém duvida: as naturais são quase sempre as mais bonitas (que coisa tão feia de se afirmar 😨). Grandes, pequenas, arrebitadas ou discretas, o que interessa, no fundo, é o equilíbrio com o resto do corpo, certo? Pois com os ácidos é a mesma coisa. Em maior ou menor quantidade, mais málico ou mais tartárico, o importante é que tenha equilíbrio. Parafraseando Charles Metcalfe, “EQUILÍBRIO, é a única coisa que todos os bons vinhos do mundo têm em comum”.
Claro que, tal como nas mamas, às vezes ganha-se com um pequeno retoque, uma pequena correção para emendar algum desequilíbrio, natural ou decorrente de algum azar da vida. Já provaram um vinho sem acidez? Gostam daquele carácter massudo e pastoso? Não, certo? Pois então que se façam pequenas correções. Desde que melhorem o conjunto e preservem o equilíbrio, serão bem vindas.
E o que dizer dos implantes de peso? Querem-nas grandes, volumosas e voluptuosas? Pode funcionar. Em certos contextos até brilham. Mas… para sempre? Tenho as minhas dúvidas.
Um vinho muito corrigido, enquanto novo pode ser entusiasmante? Pode! Mas e quando o tempo, a gravidade e a aglomeração de telómeros começarem a moldar o corpo? Pele descaída, carnes moles e de repente, ali estão - as mamas - rijas e empinadas, com uma textura de "borracha seca" apontando para a frente como se a idade tivesse passado por todo o lado, menos por elas. (para mais, veja Seca Técnica)
Há gostos para tudo, e sou dos que acreditam que o prazer não deve ser condicionado pelos equilíbrios maioritários. Se gostam, bebam lá esses vinhos com 30 ou 40 anos, de acidez surpreendentemente viva (será mesmo assim tão surpreendente?), com aquele bouquet tétrico de flores secas e fruta do chão em avançado estado de maduração.
Por isso, da próxima vez que quiserem entender a acidez de um vinho… estudem sobre mamas. É muito mais divertido e, surpreendentemente, o resultado será quase o mesmo.
Bebam vinhos que vos deem prazer. De preferência os nossos.😆
Seca Técnica
No nosso projeto, apanhamos as uvas com base na acidez. Apanhamo-las quando atingem o valor que procuramos (não é bem exatamente “no valor que procuramos”, mas para explicar com mais detalhe já cobro avença 😆) e é muito comum que nesse ponto não tenham ainda atingido a maturação fisiológica… muito menos a fenólica.
O essencial é garantir que os aromas, ou pelo menos os precursores aromáticos, já lá estejam (nem sempre se mostram, podem estar ligados aos açúcares e ser libertados apenas durante a fermentação). O resto não nos interessa. Não vamos ter o máximo rendimento em mosto nem os taninos perfeitamente maduros. Teremos quase sempre vinhos pouco alcoólicos, pouca cor e corpos elegantes, mas longe do peso que tantos procuram.
Ou seja: se o objectivo for fazer vinhos densos, alcoólicos e com muita extracção, ao famoso “estilo Parker”, então sim, a nossa abordagem está completamente errada. Porque de facto, deixar as uvas na vinha mais tempo tem como vantagem uma maior concentração de açúcares, maior definição/intensidade aromática e os taninos mais polimerizados, tornando-se mais estáveis e agradáveis ao palato.
Pessoalmente não aprecio os vinhos feitos desta forma, ou melhor... são assim como os "momentos" nos menus dos restaurantes "fine dining". Fantásticos numa dose muito pequena porque têm tudo em "muito". São super concentrados, belíssimos para impressionar a boca num primeiro encontro, fantásticos para sobressair na cegueira dos concursos, mas incapazes de me dar prazer ou provocar o desejo de beber a garrafa até ao fim.
Mas, e é neste "mas" que tudo se joga, o preço a pagar é muitas vezes uma queda significativa da acidez. Quando isso acontece, é preciso corrigir. Nada contra. Cada um faz como entende ser o correto. O que raramente se esclarece é isto: são vinhos mais intensos e poderosos de início… mas tendem também a morrer mais cedo. É falso que o álcool e/ou a acidez, só por si, sejam indicadores de potencial de guarda. Como digo, muitas vezes é precisamente o contrário.
Lembram-se dos vinhos do Alentejo no início dos anos 2000? Ou da famosa colheita de 2011? A colheita do século? Têm bebido bons exemplares recentemente? Eu não!
O princípio, parece ser este: Apanhando as uvas mais tarde teremos a concentração e os ganhos de rendimento mencionados em cima. Os vinhos serão bebíveis mais cedo e há muitos enólogos que entendem conseguir resolver os excessos, adicionando água e ácido. Os "13%" passam a "12%" e as pastosas "5g" por litro passam a "6g" ou mesmo para umas "crispy" "7g". O pH descerá também e o conjunto passa a parecer uma Barbie, esculpida segundo os mais exigentes requisitos de beleza e desejo. Engana-se assim, com um pequeno passe de mágica, o maior e mais antigo inimigo das aldrabices. O tempo.
Será mesmo que se engana?
Posso fazer uma plástica que me deixa com aspecto de 20 anos, mas isso não altera em nada a minha esperança de vida. Ou altera? É exatamente o mesmo que penso passar-se com o vinho, apanhando a uva mais madura e corrigindo os parâmetros só estaremos a fazer uma plástica que o deixa com aparência de novo durante uns tempos. Mas garanto-vos que boa parte destes vinhos já nascerão com a longevidade comprometida.
Posso fazer uma plástica que me deixa com aspecto de 20 anos, mas isso não altera em nada a minha esperança de vida. Ou altera? É exatamente o mesmo que penso passar-se com o vinho, apanhando a uva mais madura e corrigindo os parâmetros só estaremos a fazer uma plástica que o deixa com aparência de novo durante uns tempos. Mas garanto-vos que boa parte destes vinhos já nascerão com a longevidade comprometida.
Quem quiser apanhar uvas com base na acidez, como nós fazemos, tem de estar preparado para esperar pelos aromas. Muitas vezes, no início, só se sentem as notas vegetais (oh Mendes… andas sempre a apanhar uvas verdes!). E esqueçam os tintos muito escuros e extraídos. Os taninos e as antocianinas (que dão a cor), são instáveis e acabam quase sempre no fundo da cuba. Mesmo que espetem as uvas no lagar ou carreguem nas “delestages”, aquilo nunca vai ser uma "bomba". Esqueçam!
Mas sabem qual é a parte mais gostosa de tudo isto? No fim do dia… sai tudo espantosamente equilibrado... e prazeroso. Nada temos contra (até apoiamos) quem procura fazer "o melhor e mais concentrado vinho do mundo". Nós só queremos dar prazer a quem nos bebe os vinhos. E se ajudarem a fazer de um momento banal algo melhor e memorável... é o céu.
Ah! Já me esquecia: esta é também uma das razões pelas quais o nosso curtimenta não é cor de laranja. Mas isso… explicarei outro dia... se me apetecer.
Disclaimer: Lendo este artigo, podem ter ficado com a impressão de que o contrário dos vinhos feitos ao estilo "Parker" serão os vinhos feitos ao estilo "Mendes". Isso será uma conclusão errada e muito longe da ideia que pretendi transmitir aqui. Nunca tomem nada (nem mesmo o que eu digo ou escrevo 😆) como absoluto. O número de variáveis na realização de um vinho é tão grande que todas as afirmações encontrarão negações ou excepções. Sobretudo porque as uvas e o vinho estão irremediavelmente dependentes das mãos que os criam. Quem vos disser o contrário mente.
Vocês não sei, mas em mim, é dos fatores que mais contribui para que seja loucamente apaixonado pelos "quês e porquês" desta fabulosa bebida.
Bebendo, comentando, "gostando" e partilhando com os vossos contactos e amigos, estarão também a contribuir para o sucesso deste projecto, mantendo viva a nossa independência.
Também por isso.
Obrigado.
Obrigado.
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